sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

CRÍTICA À EXPOSIÇÃO "ENTRE FICAR E IR EMBORA"





CRÍTICA À EXPOSIÇÃO “ENTRE FICAR E IR EMBORA”
Charles Odevan Xavier

Este ensaio visa analisar a Exposição “Entre Ficar e Ir Embora” da dupla “Máquinas que não funcionam” formada por Cris Soares – CE e Emanuel – CE, em cartaz no Centro Cultural Banco do Nordeste” até 12 de Fevereiro de 2012 em Fortaleza-CE.

A Exposição da dupla teve a colaboração/orientação da artista Waléria Américo. Reúne trabalhos de desenhos, fotografias, vídeos e instalações.

APROXIMAÇÃO COM AS VIDEO-ARTES DA DUPLA

Em “Máquina Faz Love” - animação de 6:59 (2010 – um cyber coração vermelho desenhado batendo e bombeando sangue através de canos de ferro. No fundo onde há linhas pulsantes de um eletrocardiograma é sugerido uma cidade grande em cores verdes.

A trilha-sonora resume-se ao suposto barulho do coração batendo.

O desenho é bem feito, mas o espectador fica sem saber se a obra é uma ironia à era tecnocientífica que instrumentalizou até o amor e o desejo ou se é justamente o contrário: uma celebração a uma época de amores plastificados.

Em “Remover este Destino” - (2011) o espectador vê no centro da sala uma plataforma, onde é projetada uma animação que simula as imagens via satélite de uma cidade vista por cima.

A medida que o espectador se aproxima de alguma parte da superfície, um programa de computador move um cursor em cima da imagem fazendo aparecer ruas de um bairro nobre de alguma metrópole, que não se sabe se é Fortaleza ou não. Depois de um certo tempo a imagem amplia-se até ficar num fundo azul texturizado e pixelizado.

Eu como sou um leitor de teoria crítica logo imagino uma associação com a distopia de George Orwell em “1984”, a qual escrita na década de 1930 imaginava um mundo administrado(Herbert Marcuse) e controlado por um televisor onipresente. Hoje o Google Map talvez seja a materialização da sinistra época do “Sorria! Você está sendo filmado!”, cujo reality-shows como BIG BROTHER é apenas sua face mais cínica e tola.

Mas não posso dizer que outros espectadores tenham “politizado” a obra como eu fiz. Afinal a arte, como diz a teoria da informação: não está no autor mas no receptor.

Em “Roupa de Abraço” - (2011) – Um casal vestido com roupas listradas preta e branca de frente um pro outro. O foco da câmera se aproxima do corpo do casal que se abraça.

A cenografia é de um compartimento sem reboco e com lâmpadas penduradas na altura da cintura cria uma atmosfera claustrofóbica.

Depois de um certo tempo o espectador percebe que o casal tem um velcro nas roupas que o gruda um no outro.

Uma possibilidade de semiose: o amor, o desejo, “Eros” na pós-modernidade é sempre vinculado ao “Pathos”.Assim, nunca saímos indeléveis de nossos raros momentos de amor contemporâneo.


A instalação “Coluna”(2011) exibe dois suportes diferentes. Num deles há uma folha de compensado onde a dupla pintou uma coluna cervical em tons brancos e as “costelas” foram feitas de arame enferrujado.

Noutro ponto do espaço há uma coluna de alvenaria visivelmente feia, inacabada, “art brute”.

Uma possibilidade de leitura em que os dois “eixos”( a coluna do corpo e a coluna de alvenaria) simbolizam a fragilização emocional contrastada com a brutalidade dos afetos típica de nossa época de contatos interpessoais digitalizados e mediados por máquinas eletrônicas, faz o corpo humano aparecer escaveirado e fragmentado. Se o leitor não gostou do auto referencialidade da explicação não se preocupe, pois a contemporaneidade é autorreferencial por excelência.

Em “Tijolo”(2011) há dois suportes. Numa folha branca grande aparece um tijolo vermelho pintado em acrílica. Numa outra folha branca menor e ao lado desta, há um rascunho feito em grafite, um estudo do tijolo que vemos colorido do lado.

Será que o tijolo é uma referência de que tudo precisa de um bom alicerce, de uma boa fundamentação para que tenha consistência epistêmica? Pode ser.

Em “Demolições' (2011) Num pequeno quadro com moldura um desenho em nanquim de uma moça nua em cima de uma pilha de objetos cotidianos. Circundando há uma prosa-poética que fala de demolições.

Em “Passarinho pega-ladrão”(2011) uma fotografia colorida mostra um ninho de pássaros sobre um chão de pedregulhos e a dupla de artistas colocaram um pega-ladrão enferrujado.

Em “Caracol-buzina”(2011) numa fotografia colorida a dupla deu um close num objeto metálico corriqueiro também enferrujado.

Em “Desenho de Domingo” um nanquim sobre papel verger mostra uma moça nua, que segura uma haste, onde tenta equilibrar num lado uma porção de barquinhos de papel e noutro um pássaro pousado, para piorar a situação da moça a mesma está sobre um banquinho de madeira.

E por último na instalação “Carta para você” (2011) há uma mesa grande, onde foram colocadas duas máquinas datilográficas manuais antigas com o teclado danifado. Uma em cada ponta da mesa. Ao lado de cada máquina há um pilha de papéis oficios onde se lê o vocábulo 'amor' datilografado inúmeras vezes.

QUE SÍMBOLOS A DUPLA TOCOU?

Se olharmos cada obra da exposição “Entre ficar e ir embora” como frases de um único texto, o que revela esse texto? Esse todo? Cada significante revela uma época em que a subjetividade dos seres humanos do capitalismo transnacional pós-industrial se embotou enrijecendo-se (alvenaria), onde a afetividade se plastificou (a pilha de cartas amaradas) ou se esgarçou (interatividade “high tech”).Assim, o ser humano angustiado vive o dilema de ficar (e portanto, centrar-se) ou ir embora (expandir-se), sempre na corda bamba como a moça nua que segura barquinhos de papel(talvez feitos com as cartas de amor amassadas e não enviadas) e o pequeno pássaro pousado (simbolizando uma liberdade frágil e fugaz).

Cris Soares e Emanuel conseguiram no seu conjunto de obras, suportes e mídias refletir ou, pelo menos sugerir a reflexão sobre a instabilidade das nossas vidas urbanas demasiada humanas.

Pesquisador e ensaísta.

CRÍTICA AOS VÍDEOS RECENTES DA PRODUTORA ALUMBRAMENTO





CRÍTICA AOS VÍDEOS RECENTES DA PRODUTORA ALUMBRAMENTO
Charles Odevan Xavier

Este ensaio pretende analisar a produção recente da Produtora Alumbramento exposta sob forma de três documentários presentes na Exposição “Viva Fortaleza!1950-2010”; a qual teve curadoria de Patrícia Veloso e que está em cartaz no Memorial da Cultura Cearense do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura em Fortaleza – Ceará.

Irei examinar as obras: “Supermemórias” dirigida por Danilo Carvalho; “Casa da Vovó” dirigida por Victor Melo e o “Cidade Desterro” dirigida por Gláucia Soares.

A POÉTICA DA MEMÓRIA

O documentário “Supermemórias” - 35mm, 20 min, CE/BRASIL, 2010 – dirigido por Danilo Carvalho – Dona Bela Amores e Filmes/Alumbramento.

O filme pretende ser um olhar poético sobre a memória afetiva dos fortalezeses anônimos e comuns.

O filme é uma colagem de registros filmográficos caseiros capturados em super8mm de cenas cotidianas da década de 60, 70 e 80 no litoral de Fortaleza.

É interessante ver o filme começando mostrando a pouca ocupação predial da beira-mar fortalezense no ano de 1972.

Na sequência seguinte mostra as ruas do Centro de Fortaleza e sua típica selva de pedra cinzenta.

Em seguida mulheres grávidas aparecem em camas de hospital...corte abrupto: crianças brincando...corte abrupto:um parto no hospital...corte abrupto: onda do mar e imagens capturadas dentro de um barco...corte abrupto: pessoas tomando sol na praia, banhistas pulando da ponte metálica antes da restauração do arquiteto e urbanista Fausto Nilo.

Na trilha-sonora só consegui identificar a voz de Fernando Catatau.

E continuamos vendo jovens de cabelos grandes num provável close setentista; banhistas, famílias ouvindo chorinho e samba; saraus familiares com recitação de poesia.

Tudo muito fragmentado... e tome festas de aniversário de criança.

Até uma interrupção brusca no filme em que aparecem apenas texturas gráficas, enquanto em off voz de pai procura filho e depois voz de mãe pergunta por filho na secretária eletrônica.

Depois o filme volta a mostrar cenas caseiras de “bang bang” de meninos no quintal.

Desfiles de 7 de Setembro desfocadas com imagens sobrepostas de assembléia do movimento estudantil.

Como se vê a arte pós-moderna (Fredric Jameson) ou contemporânea (Michael Archer) canta a banalidade do cotidiano, o ordinário, o comum; e o único momento que o filme poderia ter um viés mais engajado não chega a durar nem 40 segundos, revelando que nós não temos mais tempo para o empoderamento polítcio, para a militância; pois a Assembléia de estudantes (um deles tem uma blusa b ranca com o rosto do Che Guevara) soa como um protesto datado, silencioso e impotente contra o desfile militar que conta com mais segundos, cores, barulhos, sons e glamour.

Assim, diríamos que num filme de 20 minutos - que assisti em pé dentro de um museu – sobre o passado de Fortaleza vivido nos anos de chumbo da ditadura militar há apenas 40 segundos de política explícita, o resto é preenchido pelo mais aborrecido, desfocado, corriqueiro e chato cotidiano.Talvez a intenção política do documentário seja a de mostrar que naqueles anos as pessoas comuns também iam a praia se divertir para talvez esquecer que estavam sob o jugo do momento mais duro do governo Médici.

O resultado icônico é que o vídeo é bem realizado e editado e a trilha-sonora ajuda a criar um clima saudoso nos que eram jovens naqueles anos e curioso nos decendentes dos personagens daqueles anos.

A POÉTICA DA DOMESTICIDADE

No documentário “Casa da Vovó” - miniDV, 24 mim, CE/BRASIL, 2008 – a direção é de Victor de Melo e Alumbramento.

O filme em preto e branco começa com uma criança cantando uma canção folclórica:”como pode o peixe vivo?...”

Dissolvência numa parede branca revelam cenas familiares.

Depois a mesma menina aparece sentada choramingando em cima de uma cama com um livro da escola do lado. Com o tempo ela ri, sugerindo a doçura da infãncia.

A câmera foca o fogão na cozinha fazendo almoço. Uma voz de mulher idosa canta uma música do cancioneiro popular que não consigo identificar.

Depois close na Santa ceia que aparece empendurada numa parede.Sons metálicos de panela e louça.Programa policial de tv ao fundo sonoro.

Foco na cozinha da casa.Fotogramas em dissolvência revelam as festas de aniversário que provavelmente aconteceram ali.

Em seguida uma moça varre a casa.Ao fundo programa esportivo radiofônico.Nesse momento a alvenaria danificada da casa (rebôco caindo) sugere o estrato social de baixo poder aquisitivo daquela edificação.

Jogo de claros e escuros nos “combobòs” e frestas para o quintal onde são estendidas roupas no varal criam agradáveis geometrizações plásticas.

Em seguida uma câmera num tripé mostra num giro de 360º graus a sala de estar dessa casa simples. Chama a atenção a quantidade de gaiolas de pássaros nos sofás.

A arte pós-moderna faz pastiche e assim aparecem meninos mulatos brincando no “terreiro” da frente da casa que evocam o fotógrafo francês Pierre Verger.

Depois close de calendários ou sobre santos católicos compondo uma cenografia “Kitsch” ou cafona.

Uma vela acesa em frente a um santo católico brilha criando forte impacto visual e começa o programa de rádios do Pe. Manzotti, enquanto a moça limpa o banheiro.

Dois planos de imagens justapostas revelam numa metade algo que parece ser uma tela de computador ou tela de televisão e na outra metade: um varal no quintal com bermudas masculinas.

“Casa da Vovò” celebra o cotidiano, o familar, o afetivo, o lugar da delicadeza e da ternura.Além de ser muito belo para os olhos.

A POÉTICA EM TRÂNSITO

O documentário “Cidade Desterro” - DV, 15 mim, CE/BRA, 2009. - dirigo por Gláucia Soares e Alumbramento começa com uma voz feminina em off que descreve o que Glaucia faz com objetos cênicos.Só que mostra apenas os gestos e objetos, o resto do corpo de Glaucia não aparece.

Uma segunda voz feminina diz uma prosa-poética.E numa poética em trânsito a personagem percorre diversos bairros de Fortaleza.Assim temos belas imagens do pôr do sol na Barra do Ceará próximo a ponte do Rio Ceará.E a prosa poética pontua o lugar de forma bonita.

Depois imagens no interior de um ônibus indo ou vindo da Praia do Futuro onde uma mão cola fotos na vidraça da janela do ônibus. Em seguida imagens no interior de um carro revela os morros do Rio de Janeiro ou o aeoroporto Galeão.

Depois a câmera mostra um playground na cidade 2000.

Fotos em preto e branco de homens construindo uma casa.Papel boiando na água do mar.Três negativos de foto são levadas na correnteza.

Uma foto de Glaucia some na correnteza e espuma.

Uma caixa coberta por um papel de bolinhas aparece.Glaucia tira objetos dela: cartas, cd do Chico Buarque, Fotos, pequenos bilhetes feitos à mão, slides, um cd de Elza Soares e o livro “As veias abertas da América Latina” do esquerdista mexicano Edaurdo Galeano.

No inicio do filme eu pensei que a primeira voz feminina sempre descrevendo o que em seguida se ver, fosse um procedimento estético proposital de estranhamento brechtiniano.Mas só no final da projeção e com os letreiros finais é que descubro que se trata de uma áudio descrição para deficientes visuais.

Dos três vídeos examinados é este o mais singelo, leve, com sua bela prosa-poética refrescante.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os três vídeos revelam sua filiação a um “zeitgeist” pós-moderno: em que o político é difuso e estetizado; o sagrado, quando aparece, é “kitsch” e cafona; e o familiar e o banal são glamourizados.

Vale a pena ser visto, ainda que ficar em pé nos 59 minutos totais dos três juntos possa causar algum desconforto para o espectador.

Pesquisador e ensaísta.

domingo, 22 de janeiro de 2012

CANÇÃO DOS FRACASSADOS


Estou numa festa de aniversário de uma amiga
fui convidado
todos estão alegres e bêbados
ouvindo rock dos anos 60
e entrei num quarto
e digito esse post

Eles estão brindando o sucesso de suas vidas
Todos ganham dinheiro com suas formaturas
ou tem família que os apoie.

Eu mesmo formado, mal tenho o dinheiro do ônibus
e celebro o fato de ser um desajustado econômico
mas em comparação com um terço da humanidade
desempregada: não estou sozinho.

E canto a canção dos fracassados!

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

O ESTRESSE DO DIA 05 DE JANEIRO DE 2012





O ESTRESSE DO DIA O5 DE JANEIRO DE 2012
Charles Odevan Xavier

Para poder estar escrevendo essas mal traçadas linhas tive que passar por um perengue familiar, um conflito mesmo com minha mãe, irmã e prima.E minha sobrinha ficou chorando.

Tudo motivado pelo valor da bateria nova do computador.Então posso dizer que meu desassossego familiar custou os módicos cento e cinquoenta reais da bateria nova.E que dinheiro suado!Tudo porque não queria levar o computador para um eletricista mequetrefe que fez apenas gambiarras com a bateria velha( e que sempre se esculhambava) e tinha que voltar lá pra pagar mais pelos consertos que não sustinha em definitivo o defeito.

Faz algum tempo que sei que minha família não fala o idioma que falo.Temos sempre dificuldades de comunicação.Assim, como sou orgulhoso cem-por-cento-de-ferro-nas-calçadas, sempre tenho problemas de sentir-me humilhado, quando peço o dinheiro à minha família que, pela idade quarentona que tenho, poderia já tê-la sem problemas na conta bancária.

Dependo no momento de projetos sociais ligados a uma ONG umbandista.E nenhum dos projetos até agora recebeu verba ou averbação do governo federal.

Minha família me pressiona por resultados imediatos.E não tenho no momento esses resultados imediatos.Isto causa um tensionamento insuportável às vezes.Sinto que minha família não dá crédito aos meus projetos.

E estou envolvido em projetos sociais desde 2010.E dois anos para minha família soa como 40 anos de fracassos.

Ou seja, sinto-me pressionado por eles.E lembro de trechos razinzas de minha mãe falando ainda quando fazia faculdade, que meu curso universitário não ia garantir nem as passagens de ônibus.Ela falou com um toz de voz de desprezo e humilhador.

E assim venho vivendo minha vida com longos períodos de indefinição financeira.E isso provoca mal-estar, se não fosse uma pessoa orgulhosa, não provocaria, mas como o sou: então é o verdadeiro inferno.